PAGINAS

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Conversão e Fidelidade: Eficácia contra as tentações e o pecado


1. A reflexão quaresmal traz à luz dois aspectos: as etapas fundamentais da História da Salvação e os fatos mais salientes da vida de Jesus até sua morte e ressurreição.

2. O pecado de Adão rompe a amizade do homem com Deus, fazendo com que Deus inicie uma série de intervenções para reconduzir o homem ao seu amor. Dentre estas intervenções destaca-se a Aliança com Noé e o fim do dilúvio, quando o patriarca oferece ao Senhor, em terra enxuta, um sacrifício de ação de graças pela salvação alcançada para ele e seus filhos (Cf. Gn 9,8-15).
A humanidade é purificada pelas águas do dilúvio e nasce como “nova”. A promessa de Deus é que nunca mais outro dilúvio ou outro fator de sua parte sucumbirá com a humanidade. Deus volta ao principio da Criação e mais uma vez quer entrar em relação com o homem e lhe oferece um pacto, uma Aliança. Para Ele esta aliança deve ser universal e eterna: “Eis que vou estabelecer minha aliança convosco e com vossa descendência” (Gn 9,9). 
Deus promete não romper a Aliança: “Então eu me lembrarei de minha aliança convosco e com todas as espécies de seres vivos. E não tornará mais a haver dilúvio que faça perecer nas suas águas toda criatura” (Gn 9,15). Deus promete observar a Aliança, mas e o homem?
Deus é amigo do homem, e não seu adversário. Ele propõe a Aliança e a mantém, apesar de nossa infidelidade. Ao contrário do homem, o amor e a fidelidade de Deus são de sempre e para sempre. Porém, há um meio eficaz, mesmo sendo infiéis e inconstantes, de renovarmos a Aliança com Deus: a Eucaristia. O sinal da Aliança não está mais no arco-íris, mas no Sangue de Cristo, derramado por amor de nós e para a nossa salvação.

3. O Apóstolo Pedro exorta os cristãos ao sofrimento a exemplo de Cristo Jesus (Cf. I Pd 3,18-22). 
A catequese de Pedro contém os elementos essenciais da profissão de fé que realizamos todos os domingos: Jesus morreu por nossos pecados, desceu aos infernos e ressuscitou para nos reconduzir a Deus. Segundo Pedro, todo este “caminho” que Jesus percorreu da morte a ressurreição se realiza em nós, pelo batismo, que ele explica como “purificação”, usando do simbolismo do dilúvio, que torna o homem apto a viver uma vida virtuosa, segundo a fé, a Palavra e a vontade de Deus.
As águas do batismo, enquanto destroem o pecado – como as águas do dilúvio haviam destruído os homens pecadores – nos salvam em virtude da Ressurreição de Jesus Cristo. O cristão muito mais do que Noé, é um remido através da água: não por meio do lenho da arca, mas por meio do lenho da Cruz do Senhor, em virtude de sua morte e ressurreição. Por isso o tempo da Quaresma desperta no cristão a recordação do batismo, que o purifica do pecado e o faz viver na fidelidade do Senhor, renunciando a Satanás para somente viver para servir a Deus.

4. Neste sentido torna-se oportuna a cena do deserto, onde Jesus luta contra Satanás e repele as insinuações contra Ele feitas.
Marcos, ao contrário dos outros evangelistas (Mateus e Lucas), não se detêm a descrever as tentações, mas as apresenta muito brevemente com apenas estas palavras: “E logo o Espírito impeliu Jesus para o deserto. Ai esteve quarenta dias e foi tentado pelo demônio” (Mc 1,12-13). 
Marcos apresenta Jesus tanto na pregação do Batista como no seu batismo com sinais evidentes da sua messianidade: Ele é investido da força do Espírito Santo para realizar a sua missão. Por isso que ao narrar imediatamente após estes fatos da vida de Jesus as tentações no deserto, entendemos que Marcos vê como ponto fundamental na missão de Jesus a luta contra Satanás. 
Assim como no Jordão quis Jesus juntar-se aos pecadores, como se fosse um deles, necessitado de purificação, assim também no deserto quer fazer-se semelhante a eles até na tentação, extremo limite consentido pela sua santidade e natureza divina. Aceitando a luta contra Satanás, da qual sai vitorioso, Jesus mostra que veio para libertar o mundo do domínio do príncipe das trevas, ao mesmo tempo em que mostra ao homem que ele também pode vencer o tentador.
Ao vencer o demônio Jesus anuncia a salvação, a realiza e dá inicio ao tempo do Reino de Deus: “O tempo já se completou e o Reino de Deus está próximo. Convertei-vos e crede no Evangelho” (Mc 1,15). Diante desta realidade eminente, Cristo exige do homem mudança de mentalidade, ou seja, uma conversão que proceda da fé.

5. Cristo é levado ao deserto pelo Espírito Santo, a fim de se preparar para a sua missão, por isso deixa os hábitos cotidianos, o ritmo de vida, os laços de família e amizade, para seguir um caminho que conduzirá à sua Páscoa. Esta vivência do Cristo no deserto na companhia do diabo já é uma antecipação do sacrifício de sua vida por amor de nós.
A fidelidade de Jesus ao Evangelho que Ele vai anunciar é posta á prova, antes mesmo de o anúncio começar. A nós, o anúncio do evangelho é feito em termos que nos levam a pensar que o Reino de Deus está presente, por isso a necessidade de mudarmos de vida e fazermos o que a realidade do Cristo Jesus nos propõe. Talvez seja essa a maior provação a qual somos submetidos: mudar de vida e fazer a vontade do Senhor, por isso só há um caminho, a Conversão!
A conversão é caminho de libertação, e quando o homem se esforça para trilhá-lo acaba encontrando o perigo das ilusões, e pode até perder-se na aspiração pela conversão em atos exteriores e práticas vazias. A conversão deve envolver “todo o homem”, não só como renúncia ao pecado, mas como nova orientação ao futuro. Isto se chama mudança e implica freqüentemente em crises de fé, em “estágios de deserto”, que não terminam no desespero, mas na mais profunda experiência de Deus.

6. Estamos prontos a crer no Evangelho? A cortar o que ficou para trás e levar a sério a Aliança que temos com Deus? A viver com consciência limpa? A deixar-se conduzir pelo Espírito Santo aonde Ele o quiser e a percorrer o caminho de Cristo rumo à sua Páscoa, com disponibilidade e todas as exigências de uma autêntica conversão? É possível tomar esta postura em tempos tão atribulados?
De fato, este nosso tempo é um verdadeiro “dilúvio”, onde se salvam os que, como Noé, não estão satisfeitos com o bem-estar alcançado por sua civilização, e crêem na Palavra de Deus, mesmo a custa de enfrentar o ridículo de construir uma arca. Salvam-se os que, como Cristo, deixam tudo para, com Ele, construir uma humanidade nova. Salvam-se os que crêem no Evangelho. Salvam-se os que deixam ser guiados pelo Espírito Santo. Salvam-se os que se abrem a um verdadeiro e autêntico processo de conversão. 
A conversão ao Cristo Jesus deve se exprimir em todos os campos e todas as relações, um passo a cada dia, interrogando-se sempre sobre o que pode se fazer, e o desejo de querer fazê-lo para o alcance da salvação. 

7. A Quaresma nos convida a crer no Evangelho, portanto, a nos libertar de todo ídolo e mitologia, a confiar plenamente no Cristo e em sua Palavra, a engajar-nos no caminho por Ele indicado, passando pelo sacrifício e a Cruz, visando a atingir a libertação da Páscoa, a ressurreição.
O cristão não está isento das tentações, pelo contrário, muitas vezes quanto mais se esforça para servir a Deus com fervor, tanto mais se esforça o demônio para impedir-lhe o caminho, como quis impedir a Cristo de cumprir a sua missão redentora. Por isso o cristão deve recorrer às armas usadas pelo próprio Jesus no combate com o demônio: penitência, oração e perfeita conformidade à vontade do Pai. Podemos resumir estes três aspectos como fidelidade, e quem é fiel à Palavra de Deus, quem dela se alimenta constantemente, não poderá ser vencido pelo Maligno, jamais.
A conversão e a fidelidade a Deus são armas eficazes na luta contra as tentações e o pecado. A conversão nos motiva a voltar ao estágio original que é a perfeição; a fidelidade a Deus, Cristo nos ensinou, nos mostrando que aquele que é fiel a Deus, por Ele é honrado num batismo que sepulta a nossa morte e nos dá uma nova vida, plena e ressuscitada em Cristo Jesus.

Sem. Rodolfo Marinho de Sousa
Primeiro Domingo da Quaresma (Ciclo A) – 25.02.2012

Nenhum comentário:

Postar um comentário