1. “Acaso pode a
mulher esquecer-se do filho pequeno, a ponto de não ter pena do fruto de seu
ventre? Se ela esquecer, eu, porém, não me esquecerei de ti”. (Is 49,15). Esta
é uma resposta apaixonada de Deus a seu povo, um sinal da obra do seu amor.
Esta palavra de
Deus posta na boca do profeta Isaias se dá em um momento em que o Povo de Israel
está retornando à Pátria e Jerusalém está sendo reconstruída. Neste contexto, o
Profeta Isaias nos apresenta Deus não como o criador onipotente, o soberano
absoluto do mundo, a realizar sua vontade em todas as circunstâncias, mas como
um “apaixonado” que tem as mãos tatuadas com a imagem da pessoa amada, a fim de
tê-la sempre presente, a trazendo dentro de si, com amor superior ao próprio
amor materno. O convite é para que o povo desperte para o amor de Deus, um Deus
apaixonado.
O amor infinito
de Deus agirá e há um tempo particular no qual Ele decide intervir. Uma
intervenção de providência, mas, sobretudo, de amor.
2. Israel é um
povo separado, um povo especial, um povo que se distingue de outros povos, não
porque receba mais do que os outros povos em relação aos bens da terra, mas
porque é um povo eleito, eleito por Deus, separado por Ele para si. Israel não
deixa de ser a “terra prometida”, e repete na sua experiência de vida a
experiência de ser o guarda dessa promessa através de gerações.
As profecias à
cerca desta realidade são longas; de fato, os bens prometidos a Israel demoram
a chegar e às vezes parece que Deus está fazendo certa “zombaria” do seu povo.
Porém, estes bens prometidos a Israel, segue uma dinâmica semelhante ao trato
de um pastor de ovelhas com o seu rebanho.
3. Ovelhas
gostam de sal. Quem dá o sal é o pastor. Ele usa este meio para trazer as
ovelhas consigo, para criar laços de afeto e confiança, de modo que as ovelhas
o sigam até o pasto. Se o sal cessa, as ovelhas se perdem. Em resumo, elas não
são nada, sem o pastor. Ai delas se o pastor se desinteressar pelo rebanho, se
não lhes der mais sal.
O Senhor é o
pastor de Israel. Ele concede progressivamente bens a seu povo, de modo a tê-lo
consigo. Ele não esquece o seu rebanho e nem deixa o “sal” acabar. Ele não se
esquece, Ele está perto. Ele tira Israel de sua tranquilidade para depois
caminhar à sua frente. Ao seguir o Senhor, Israel vê seu próprio caminho e se
torna livre.
4. A segurança
de Israel está no seu Pastor. A nossa segurança, enquanto membros do Povo de
Deus, igualmente eleito, também está Nele, nosso Pastor e Guia. Encontramos a
imagem deste Deus apaixonado em Jesus, o Salvador. De fato, Ele nos amou tanto
que nos deu seu Filho amado, é o que lemos na Escritura, e em Jesus vemos a
Imagem do Pai, sua ação e vida.
5. Nos
versículos 17ss do capítulo 5 do evangelho de João, encontramos a resposta de Jesus
a este respeito: “Meu Pai trabalha sempre, portanto também eu trabalho” (Jo
5,17).
Os judeus
entendem esta fala de Jesus como uma afirmação de sua semelhança com Deus (e de
fato, o é), suscitando-lhes raiva e o desejo de matá-lo, ainda mais porque Jesus
havia violado a lei do sábado ao curar o paralitico na piscina de Betesda (Cf.
Jo 5,1-16).
Jesus prossegue
na sua resposta, longa inclusive, na qual expõe três temas:
·
A
dependencia de Jesus do Pai nas obras, milagres, juízo e vontade (Jo
5,19-20.30);
·
Sua
Igualdade com o Pai, expressa no vivificar e julgar e no receber a mesma honra
que o Pai (Jo 5,21-24);
·
Escatologia
presente e futura (Jo 5,24-28).
Esta realidade
da nossa fé está presente no credo que professamos, na versão
niceno-constantinopolitana: “Deus de Deus, Luz da Luz, Deus verdadeiro de Deus
verdadeiro, gerado, não criado, consubstancial ao Pai”.
Portanto, a obra
de Jesus é obra do Pai; o milagre de Jesus é milagre do Pai. Jesus se revela
assim na sua igualdade com o Pai.
6. Encontramos
nesta página do Evangelho dois pontos que são essenciais para entendermos este
mistério de Jesus e o Pai: O poder de ressuscitar os mortos e o de julgar todos
os homens.
O poder de
ressuscitar os mortos, segundo o Primeiro Testamento é prerrogativa exclusiva do
Pai (Dt 32,2-9; 2 Rs 5,7; Tb 13,2), que o exerce livremente e a seu critério.
Este mesmo poder foi dado ao Filho, pois ele ressuscita o filho da viúva de Naim, a filha de Jairo e seu amigo Lázaro.
O pode de julgar
todos os homens, deriva do primeiro: tendo o Filho o poder sobre a vida e a
morte dos homens, tem necessariamente o poder de dirigir o curso de suas vidas
e sancionar suas obras com um destino eterno de felicidade ou condenação.
7. Pois bem, se
o Pai é Pastor, o Filho também é.
O Filho é a Palavra
do Pai encarnada em nosso meio. O Pastor chama as ovelhas e elas escutam a sua
voz. Assim, a Palavra que Jesus Pastor diz é que dá a vida eterna às suas
ovelhas que o ouvirem. Quem ouve a Palavra de Jesus, se abre a um processo onde
se opera uma verdadeira “ressurreição”, da qual a ressurreição final não é mais
que desenvolvimento e manifestação.
Confiemos em Deus e
nas suas promessas. Deixemo-nos guiar pelo Pastor de nossas almas e provemos de
sua fidelidade e providência, mesmo que pareça que o “sal” não nos chegará
mais.
São Paulo, 02 de Abril de 2014
Quarta feira da 4a. Semana da Quaresma